Família do esporte

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Por Raphael Favilla  •  21 de Janeiro de 2022

Quem acompanha e gosta de esportes conhece ou já ouviu o sobrenome Roese ao  menos uma vez. Com suas raízes fincadas no sul do Brasil, a família de ascendência alemã tem diversos membros de destaque no esporte brasileiro. No vôlei, Paulo e Heloísa Roese defenderam a seleção brasileira. Walter Roese atuou com a bandeira do Brasil no peito jogando basquete. Hoje trabalha na NBA, nos EUA.


Já no tênis, foi Fernando Roese o responsável por consolidar o brasão da família na modalidade. Seu pai, Pedro Roese, havia dado os primeiros passos no esporte, chegando a ser campeão estadual na década de 50. Mas Fernando foi mais longe. Ele representou por treze vezes as cores verde e amarela na Copa Davis, ajudando o Brasil a chegar à semifinal em 1992, na melhor campanha do país na história da competição. Formando dupla com Cássio Motta, conseguiu derrotar a Alemanha de Boris Becker. Anos antes, em 1987, já havia conquistado a medalha de ouro em simples e a medalha de bronze nas duplas mistas junto à curitibana Gisele Miró nos Jogos Pan-Americanos de Indianápolis. Foi top 100 mundial nas duas categorias.


Agora é a vez de seu filho, Pedro Saueressig Roese, fazer parte dessa trajetória de sucesso e integrar a galeria de feitos esportivos do clã gaúcho de Novo Hamburgo. Aos 28 anos, o hamburguense vem construindo uma trajetória bem-sucedida e inspiradora no tênis dos Estados Unidos. Em 2014 e 2017, por exemplo, conquistou dois títulos nacionais (NCAA) defendendo uma universidade da Flórida.


Pais e filhos


Voltemos um pouco no tempo. O ano é 2008, e Pedro faz sua estreia na categoria 14 anos no torneio MasterCard Junior's Cup, em Curitiba. No saibro do Graciosa Country Club, o garoto vence em três sets e a imprensa especializada fareja uma boa matéria. Mais do que um simples resultado, aquela vitória trazia para a notícia outra história a ser contada.


Fora de quadra, era Fernando quem acompanhava, guiava e vibrava com Pedro. O repórter não pôde deixar de perguntá-lo sobre os desafios de ser pai e técnico ao mesmo tempo.


“De todas as experiências que eu tive como treinador de tenistas profissionais, a com o meu filho é a mais sofrida. Não tem comparação. O primeiro desafio é eu conseguir administrar meu nervosismo. É sempre mais fácil para quem está dentro da quadra porque você pode dar um grito, extravasar”, disse. “Outro ponto importante é encontrar o equilíbrio entre passar a mão na cabeça e exagerar nas cobranças. O desafio é ser o carrasco e ao mesmo tempo amigo”, explicou à ocasião ao jornalista da Tênis News.


Hoje, conversando com a Nittenis, Pedro relembra dessa época. “Na verdade, eu  gostaria que ele tivesse sido até mais duro comigo. Como costumava ser com os outros. Comigo ele sempre foi um cara engraçado, suave, alto-astral. Era assim tanto nos torneios como nos treinamentos. Foi muito bom por ter vivido essa experiência de pai e filho dentro e fora das quadras”, conta. “Eu nunca senti pressão por ser filho do Fernando Roese, mas sim orgulho. Era um desafio, claro. Eu treinava duro porque queria talvez um dia ser como ele. Mais do que pressão, era uma motivação. Nos torneios eu era conhecido como o filho do Fernando e eu nunca me importei com isso. Meu pai tem grande amigos no tênis, e muitas portas se abriram pra mim. Sempre encarei esse parentesco não como um peso, mas sim como um privilégio”, acrescentou.


Do sul do Brasil ao sul dos Estados Unidos


Com a influência do pai e a verve familiar esportiva no sangue, Pedro começou a jogar tênis aos quatro anos de idade. Na sua infância e adolescência, treinou e praticou nas sociedades Aliança e Ginástica, OK Center, São Leopoldo Tênis Clube, Instituto Gaúcho de Tênis (IGT), em Porto Alegre, e na Academia de Bebe Perez, em Montevidéu, no Uruguai. Pedro sempre esteve entre os melhores do Rio Grande do Sul no ranking estadual infanto-juvenil.


“A minha base foi incrível, não posso reclamar. Aos 12 anos fui para o IGT e lá tive acesso aos melhores coachs do estado, pode-se dizer que até do país. E a estrutura era sensacional”, lembra.


Aos 17 anos, veio a decisão de se dedicar ao tênis universitário. Ele viajou aos EUA em agosto de 2012, logo após completar 18 anos. O primeiro destino foi Pensacola, na Flórida.


“Eu sempre me machuquei muito, era muito fraco, magrinho. Eu diria que foram as lesões que me impediram de jogar tênis profissionalmente. Não conseguia dar continuidade aos treinamentos e nos torneios. Jogava cinco meses, parava dois. Mesmo assim tive alguns bons resultados, mas nada muito expressivo. Foi aí que perto de concluir o ensino médio eu decidi vir para os EUA, vendo que dificilmente teria o sucesso que eu gostaria de ter no circuito profissional. Jogando o tênis universitário, poderia continuar fazendo o que amava, que era estar nas quadras, e conquistar o diploma nos estudos”.


Jogando o tênis universitário Pedro conta que viveu os melhores momentos de sua vida. Na University of West Florida (UWF) teve a oportunidade de fazer parte de times bons e  vitoriosos. “Quando cheguei aqui falava um inglês bem mais ou menos. Tinha uns brasileiros na equipe e eles me ajudaram a me enturmar. Achei que fosse chegar e jogar, mas demorei a me adaptar à quadra rápida e fiquei meu primeiro ano como redshirt”, relembra.


No circuito esportivo universitário norte-americano, redshirt é como chamam o atraso ou suspensão da participação de um atleta para prolongar seu período de elegibilidade. Normalmente, a elegibilidade atlética de um aluno em um determinado esporte é de quatro temporadas, alinhadas com os quatro anos de aulas acadêmicas normalmente exigidas para obter o diploma de bacharel em uma faculdade nos EUA. No entanto, em um ano de camisa vermelha, os alunos atletas podem assistir às aulas na universidade e praticar com a equipe, mas não podem competir.


“Em 2014 apresentei boa evolução, e me colocaram para jogar como número um de duplas com o Bruno Savi. Para um cara freshman, no primeiro ano, foi uma ótima oportunidade que me deram. Joguei por dois meses, vários jogos, e não perdi nenhum. Mas aí rompi os ligamentos do joelho esquerdo. Foi uma fase bem complicada, muitos meses parado, passando por cirurgia com 19 anos, sem nenhum familiar por perto. Hoje, considero esse fase como uma das melhores coisas que já me aconteceu. Me amadureceu, me deu força para treinar mais forte. Tive que treinar com muita dedicação para poder voltar ao time”, conta Pedro, que fez parte da campanha campeã de sua faculdade naquele ano, mas que não pôde participar dos últimos torneios devido a lesão.


No final de 2016 Pedro foi morar e estudar em Hong Kong por um semestre, para completar o currículo obrigatório de seu curso em Marketing & Business. De lá continuou treinando, para não perder espaço no time quando voltasse. “Quando retornei a equipe estava muito bem, e tive que esperar uma oportunidade. Ela veio quando um dos titulares de duplas se machucou. Eu estava bem preparado, entrei no line-up e não saí mais. Nessa temporada de 2017 tivemos um recorde de 24 vitórias e só uma derrota. Fomos campeões nacionais mais uma vez. Hoje tenho dois anéis com meu nome”.


“Não posso esquecer de lembrar. Coloca aí na matéria”, brinca. “Tenho o quinto melhor recorde de porcentagem de vitórias em uma temporada regular da história da universidade. E o terceiro melhor recorde de porcentagem durante os quatro anos de curso. Os dois recordes em duplas”.



Pedro ergue seu segundo troféu da liga universitária dos EUA

Assistant Coach


Terminando o ano de 2018, Pedro passou a exercer uma nova função. “Fui escolhido através de um processo seletivo, e depois de algumas conversas com o head coach Derrick Racine, fui convidado a tomar essa desafiadora posição. Durante dois anos tivemos bons resultados. Participamos mais uma vez do torneio nacional e também nos sagramos campeões regionais, em 2019. Tinha um trabalho duro de recrutamento, onde tive de julgar qual seria o melhor jogador para fazer parte da equipe. Tive o prazer de ter recrutado dois jogadores ALL-American em simples e também em duplas”, destaca.


“A melhor parte do trabalho eram as viagens. Ali eu podia me conectar com os jogadores de forma mais profunda. Com mais intimidade, a relação com os rapazes melhorava e o feedback era mais produtivo para o trabalho. Quando o jogador percebia que meus apontamentos faziam a diferença no jogo dele, passava a respeitar mais a minha função. Que eu estava ali para somar, ajudar. Que meu tempo e a minha dedicação eram para os garotos jogarem melhor, que a vitória deles também é a vitória do assistente. O título é de todos. Infelizmente eu exerci essa função na temporada que começou a pandemia. Dirigimos uma van por 10 horas até o Texas. Quando lá chegamos, os jogos foram cancelados e tivemos que pegar a estrada de volta para casa. Foi minha última vez como assistant coach. Não tive o gostinho de terminar aquela última temporada”, conta.


“Mas tenho a certeza que eles levaram meus ensinamentos tanto quanto eu levei aquilo que eles me ensinaram. Uso tudo que aprendi como coach hoje em minha academia”, finaliza.


RG Tennis


A academia em questão é a RG Tennis Center, em Pensacola. Em 2018, um ano depois de formado e procurando trabalho, Pedro se uniu ao amigo paranaense Valentim Golçaves e juntos decidiram abrir a RGTC. “Procurei durante tempo emprego na área em que havia me formado, mas foi muito difícil achar algo em que eu me via atuando. O tênis falou mais alto”.


“Por razões de visto de trabalho, deixei o Valentim tocando a academia e fui fazer MBA na UWF e exercer o cargo de assistant coach, como falei anteriormente. Ele tocou a RGTC praticamente sozinho enquanto eu terminava o mestrado”, continua.


Em três anos de RGTC, Roese e Valentim conseguiram saltar o número de clientes. De um pouco mais de dez jogadores inicialmente para mais de 200 clientes semanais que utilizam hoje as dependências da academia. “Hoje temos o maior programa de crianças do North West da Flórida”, se orgulha.


“Para 2022 queremos crescer a academia e fazer com que nossos jogadores joguem cada vez melhor. Passar a minha experiência para todos aqueles que eu possa alcançar. O objetivo é formar bons jogadores e influenciar o máximo de pessoas possível. Formar atletas de alto rendimento é um dos objetivos principais, mas também o de fazer crescer o tênis na comunidade. Fazer a galera conhecer e curtir o esporte. Tudo isso com o espírito de jogo sul-americano, que é um pouquinho mais feliz e descontraído do que aquele tênis pragmático que vemos muito por aqui”, encerra.


Pedro em ação na sua academia em Pensacola, na Florida

Fotos: Divulgação / Martin Behrend


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