Foco total na recuperação

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Por Raphael Favilla  •  30 de Outubro de 2021

Luisa Stefani vivia seu melhor momento. Com a compatriota Pigossi, acabara de conquistar uma histórica e inesperada medalha de bronze nos Jogos Olímpicos de Tóquio. Como se não bastasse, vinha de três finais nos três primeiros torneios que jogou ao lado da canadense Gabriela Dabrowski. E estava ali, jogando para uma plateia de 14000 espectadores, que lotavam o mítico estádio Louis Armstrong em Nova Iorque. Fazia semifinal de US Open. O primeiro da carreira.

 

E aí tudo mudou.

 

No tie-break do primeiro set, quando estava 2 a 0 para a dupla da brasileira, veio a queda. Luisa se movia junto a rede quando virou o joelho direito e caiu em quadra gemendo de dor. Minutos de apreensão e atendimento médico. Luisa tentou levantar. Não conseguiu. Precisou sair de cadeira de rodas da quadra. Com a brasileira já na área médica, a árbitra da partida anunciou que o confronto, até então empatado em 6 games a 6, estava paralisado. Minutos depois, o jogo foi encerrado. Dezessete dias depois, passaria por uma cirurgia em Chicago, na Rush University Medical Center, com o Dr. Jorge Chahla, o mesmo que operou Juan Martin del Potro. O diagnóstico? Ruptura total do ligamento anterior cruzado do joelho direito.

 

— Foi uma equipe super boa, que me foi recomendada e acabei adorando. Gostei muito das conversas com o doutor Chahla, um especialista em joelho e que já fez essa cirurgia muitas vezes. Ele me deu muita atenção antes e depois da cirurgia, me passando muita confiança de que a gente estava traçando o caminho certo para o sucesso da recuperação.

 

A recuperação para a lesão de Luisa gira em torno de 6 a 12 meses. A brasileira, que agora se recupera em Tampa, outra cidade norte-americana, acredita que estará em quadra novamente nesse meio tempo. Quem sabe para disputar torneios da gira de saibro, que antecedem Roland Garros? Nos bastidores, comenta-se que o WTA de Roma, disputado tradicionalmente em maio, é o principal alvo de Luisa e sua equipe.

 

— A fisioterapia é feita em etapas. Traçaram metas, e o joelho precisa alcançar estes objetivos antes de passarmos para o próximo passo da recuperação. Por isso temos um caminho longo pela frente. O tempo de retorno às quadras varia, porque cada corpo é um corpo e cada caso é um caso. No meu, o joelho tem respondido super bem ao tratamento. É preciso também deixar o corpo acostumar com tudo que foi feito. Foi uma cirurgia invasiva, então o corpo precisa se adaptar aos novos tecidos, precisa cicatrizar. Então, os próximos passos vão depender de cada etapa do processo de recuperação. Eu coloco uma meta de 8 a 9 meses para voltar às competições.

 

Luisa fica mais algumas semanas em Tampa, e pretende retornar ao Brasil no final de novembro para continuar a recuperação por aqui. “Supostamente em 3 meses já vou poder correr, fazer coisas pra frente. O movimento lateral é o que mais pega na estabilidade do joelho. Mas tudo depende muito do processo, de como vou responder à fisioterapia”, contou.

 

— A lesão veio em um momento inoportuno. Foi um grande choque. Na hora eu já sabia do que se tratava, e ali já mudei o foco para o que precisava fazer, quais seriam os próximos passos para a recuperação. Conversei muito com minha psicóloga. Conversas diárias nos primeiros dias após a lesão, para me ajudar a lidar com tudo. Mas o que me ajudou mais foi traçar metas, ir aos poucos descobrindo os próximos passos. É o que tenho feito desde então. Focar na fisioterapia, escutar os médicos, escutar meu corpo. Descansar o corpo, descansar a mente. A longo prazo os planos são os mesmos. Agora é voltar a competir quando for saudável e seguro.

 

Stefani também é cautelosa quando perguntada com quem fará parceria quando retornar às quadras.

 

— Não tenho nenhum combinado, ainda é muito cedo para definir. Obviamente tenho ideias de com quem eu gostaria de jogar. Claro que se eu pudesse voltar com a Gaby [Dabrowski] seria ótimo. Mas como ainda tem muito tempo pela frente e muitas variáveis em jogo, não é minha prioridade no momento fechar esta questão. Mas quando tiver chegando a hora de voltar a competir será um dos focos de decisão

 

Apesar de ter permanecido no 11º lugar do ranking da WTA, Luísa poderá finalmente entrar no top 10 na próxima segunda-feira. Isso porque estão previstos os descontos de muitos pontos conquistados no WTA Finals e no WTA Elite Trophy de 2019, que devem causar várias mudanças nas primeiras posições do ranking e afetar algumas concorrentes diretas da brasileira. Stefani, que chegou a ficar a apenas um ponto do top 10 na semana passada, tem atualmente 4580 pontos e tem apenas 14 a descontar na semana.

 

Se ocorrer uma combinação favorável de resultados, Luisa será a primeira mulher brasileira a figurar entre as 10 melhores do mundo desde que o ranking da WTA foi implementado, no longínquo ano de 1975.

 

Por essas e por outras que para muitos, e também nas palavras de Alexandre Cossenza, jornalista do blog Saque e Voleio, Luísa “não só é o grande nome de hoje como é a melhor coisa que aconteceu ao tênis brasileiro em muito tempo”.

 

“Luísa tem um exemplo importante a dar: é, sim, possível, jogar tênis universitário nos Estados Unidos e entrar no circuito de forma competitiva. É uma lição que muitos por aqui ainda precisam aprender. O college não precisa ser visto como uma rota para atletas incapazes de ganhar a vida no circuito profissional. Talvez seja mais inteligente olhar para o esporte universitário como uma estrada que ajuda a separar quem tem ou não as qualidades, técnicas e mentais, para ir longe na profissão. Luisa ‘acontecer’ também é bom por ela ser mulher em um país onde o tênis feminino é deixado de lado. Não há nenhum movimento de autoridade alguma para atrair mais meninas. A maioria acaba optando por vôlei ou basquete, modalidades com referências de sucesso no Brasil e muito mais baratas para os pais no alto rendimento. Luisa já é essa referência que faltava, mas não só isso. Desde muito tempo antes da medalha, ela já trabalha para estimular crianças a jogarem por aqui. Sua parceria com a Liga Tênis 10, conduzida de forma brilhante e, por que não, heróica pela Bruna Assemany no Rio de Janeiro, é louvável e ainda deve render muito”, completou o jornalista do UOL.

 

 

Melhor jogada e breve histórico

 

Stefani e Dabrowski venceram o prêmio de melhor jogada do mês de agosto da WTA. O lance foi na semifinal do WTA 500 de San Jose, na Califórnia, diante da australiana Ellen Perez e da tcheca Kveta Peschke.

 

O mês de agosto foi especial para Luisa, com seu maior título no WTA 1000 de Montreal, vice no WTA 1000 de Cincinnati, vice em San Jose e, pouco antes, havia conquistado a inédita medalha de bronze nos Jogos Olímpicos de Tóquio, ao lado de Laura Pigossi.

 

O ano de 2021 foi especial, com 40 vitórias e 59 jogos, sendo:

 

- semifinalista : US Open (Grand Slam) - com Gabriela Dabrowski- vice-campeã : WTA 1000 Cincinnati - com Gabriela Dabrowski

- campeã : WTA 1000 Montreal - com Gabriela Dabrowski

- vice-campeã : WTA 500 San Jose (EUA) - com Gabriela Dabrowski

- Medalha de bronze : Jogos de Tóquio - com Laura Pigossi

- vice-campeã : WTA 1000 de Miami - com Hayley Carter

- vice-campeã : WTA 500 de Adelaide - com Hayley Carter

- vice-campeã : WTA 500 de Abu Dhabi - com Hayley Carter

 

 

Fazendo história na carreira - Luisa, de 24 anos, começou a jogar tênis aos 10 anos, na B.Sports, no bairro de Perdizes, em São Paulo, onde nasceu. Disputou as chaves principais dos quatro Grand Slams juvenis, atingindo as semifinais de duplas do US Open juvenil em 2015, quando chegou a 10a. posição do ranking mundial juvenil.

 

Foi para os Estados Unidos para estudar e jogar tênis. No circuito universitário jogou pela Pepperdine University, na Califórnia, e atingiu a segunda posição no ranking da ITA (Intercollegiate Tennis Association). Foi nomeada caloura do ano 2015 pela ITA, compilando uma campanha de 40 vitórias e apenas 6 derrotas. Entre 2015 e 2018, ainda no circuito universitário americano, dedicou-se parcialmente ao circuito profissional da ITF, o que não a impediu de conquistar 10 títulos e atingir outras 5 finais de duplas naquele circuito. Terminou 2018 como 215ª. do mundo em duplas e 753ª. em simples.

 

Optou por trancar a faculdade para disputar o circuito profissional integralmente a partir de meados de 2018. Ganhou destaque nas duplas e começou a colher resultados já em 2019, conquistando um título no WTA de Tashkent, no Uzbequistão, e o vice-campeonato em Seul, na Coréia do Sul, em outubro, com a então nova parceira, a norte-americana Hayley Carter, terminando o ano perto das 70 melhores do mundo.

 

Em 2020, conquistou o WTA 125 de Newport Beach, na Califórnia e chegou às oitavas de final do Australian Open. Após a quarentena, comemorou o título do WTA de Lexington, nos Estados Unidos. Terminou o ano como a 33ª do mundo, primeira brasileira no top 40 em mais de três décadas. Começou 2021 com a final no WTA 500 de Abu Dhabi, nos Emirados Árabes, alcançando o top 30 - a primeira brasileira desde 1976 - e chegou à segunda decisão em Adelaide e à terceira em Miami, torneio da série WTA 1000. O vice-campeonato em Miami permitiu que Luisa subisse para a 25ª posição no ranking, o melhor de uma brasileira na história desde que o ranking WTA foi criado em 1975. Em junho ganhou mais duas posições - 23º lugar. Continuou subindo no ranking e com o vice-campeonato em Cincinnati subiu para 17ª do mundo. Com a semifinal alcançada no US Open, hoje está na 11ª posicão do ranking.

 

Foto: instagram de Luisa Stefani


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