Papos e reflexões: Carpe diem!
Há alguns poucos anos, no charmoso apartamento do nosso grande Thomaz Koch, batíamos um papo, o anfitrião Thomaz, o craque gaúcho Marcos Daniel e o super sueco Mats Wilander, além deste colunista. Esse papo, (regado a champanhe francesa, guaraná e Pringles) ocorreu durante um torneio do ATP/Champions Tour que acontecia ao lado, no vizinho Copacabana Palace. Wilander, com seu jeito simples e educado, falava da época em que a Suécia dominou completamente o tênis mundial, produzindo em série verdadeiras máquinas de jogar tênis (Edberg, Johanson, Nystron, Lundgren, Larson, Norman, Enqvist, Jarryd, Pernfors, Bjorkman (ufa!) e muitos outros, todos dotados de grande físico, força mental, educação e bom humor. Além de uma invejável resistência quando se tratava de comemorar as inúmeras vitórias individuais ou na Copa Davis (rsrs)! Todos aproveitavam ao máximo a vida no circuito, viajando entre amigos e, principalmente, convivendo de perto com o maior herói da historia esportiva da Suécia, o mito Bjorn Rune Borg!! Borg, que levava o tênis, bem como as comemorações, muito a sério (rsrs), era a prova viva e palpável de que esse maravilhoso estilo de vida era possível. Dizia o Wilander: “ o que a gente queria era jogar, jogar, jogar...”
Recentemente, em conversas distintas com meu velho parceiro de duplas e companheiro de viagens, Eduardo Eche, e com o “hermano-tupiniquim” Walter Gringo Preidickman, (ambos técnicos e formadores do mais alto gabarito) ouvi a mesma declaração contundente. “Hoje em dia, parece que os técnicos querem mais do que os jogadores!”. Lembrei-me imediatamente do papo no apê do Thomaz e do artigo abaixo, publicado nesta coluna há alguns anos, tratando do assunto por uma ótica bem pessoal.
No clima de Nittenis 20 anos…vamos a ele!
Turning points... carpe diem!
Há certos momentos importantes na vida em que nos deparamos com o futuro de maneira muito clara. São momentos de escolhas, de decisões, de “guinadas”, ou simplesmente de percepção, contemplação e satisfação pela certeza de estarmos no caminho certo. São “turning points”...
Algumas vezes, só nos damos conta depois de termos passado por esses momentos. Outras vezes, conseguimos percebê-los a tempo de curti-los ao máximo.
Aí vai uma historinha bastante pessoal...
Nos anos 70, no decorrer de um período de tênis infanto-juvenil bastante satisfatório, eu e meus irmãos Edgard e Lincoln competíamos pelo Tijuca Tênis Clube, na Zona Norte do Rio de Janeiro. Apesar de morarmos em Niterói, treinávamos lá de segunda a domingo, passando muitas horas nos ônibus inter-municipais , e muito mais horas ainda nas quadras. Devido a um bem-humorado preconceito da época, os jovens tenistas tijucanos “pegavam no nosso pé” por sermos de Niterói (do outro lado da poça, onde a melhor coisa é a vista do Rio, etc...) . Entretanto, quando jogávamos nos clubes da Zona Sul, os tenistas locais também “pegavam no pé” pelo fato de jogarmos pelo Tijuca (ZN, subúrbio, etc...). Eu ainda não sabia que em um futuro bem próximo, no Texas, USA, por onde eu e Lincoln viríamos a jogar tênis universitário, mexicanos, porto-riquenhos , sul-americanos e afins formavam um só grupo de terceiro-mundistas (mais gente “pegando no pé”). Tudo isso sempre foi tratado com muito humor, nos papos que eu e meus irmãos tínhamos com nosso pai, nas muitas horas dentro do Corcel azul 75.
Início do ano de 1979 (há exatos 40 anos!), acabo de passar à semifinal de uma das etapas classificatórias da Copa Hering, à noite, no aristocrático e elegante Rio de Janeiro Country Club, em Ipanema, ficando a uma rodada da finalíssima em Sampa, onde alguns felizardos disputariam uma vaga para um torneio juvenil antes de Wimbledon, em Londres. Surge meu amigo Marcos “Tico”dos Anjos: “Domingos, você pode bater uma bolinha com o Thomaz?” (Thomaz Koch, maior ídolo do tênis sul americano até então, retornava de um ano inativo devido a uma cirurgia de hérnia de disco, e estava voltando aos treinos). “Claro que sim!!”, respondi. Fomos para a quadra ao lado da piscina, mais reservada, para fugir do tumulto, pois havia um outro jogo do torneio em andamento, o que não mudou nada, pois todo o público correu para assistir ao “treino do Thomaz Koch” (acho que ninguém deve ter me visto, pois todas as atenções se voltavam, naturalmente, para o outro lado da quadra). Para mim, foi um momento mágico! Apesar de muito nervoso, consegui fazer um bom treino, não sem antes errar muitas bolas, ( logo eu, “bacanão”, que sempre “tirei onda” de ser “super regular”...). Era muito difícil não prestar atenção aos detalhes daquele momento... Thomaz, cabelos longos, vestindo um agasalho Adidas verde com listras amarelas , com o nome KOCH nas costas, em letras “garrafais”, usava uma raquete Wilson T2000, que não parava de brilhar sob a iluminação amarelada das quadras do Country. E eu, nítero-tijucano (muito em breve, cucaracha terceiro mundista... rsrs ), estava ali, no mais aristocrático de todos os clubes brasileiros , “soltando a esquerda”, com uma lenda viva do tênis mundial! Pensei: “É isso que eu quero!”. Ali era o “turning point”! Percebi que não pensava no jogo do dia seguinte. Queria curtir aquele momento (Carpe Diem!) e, num pensamento meio louco, que passa muito rápido nessas horas, torcia para que pudessem acontecer outros momentos como aquele. Já entendia, naquele momento, que o “barato” está no processo, não no resultado final, que pode ser alterado por milhões de fatores.
No dia seguinte, eu, cabeça um do torneio, aos 17 anos , perdi facilmente para o Chapecó (Carlos Chabalgoity), de 14 anos apenas. Uma das derrotas mais “doídas” da minha carreira, até aquele momento. Poderia usar a desculpa de ter ficado treinando até tarde, mas não era a verdade. Treinar muito nunca foi um problema para mim. Ok, talvez o “foco” tenha mudado. Mas o certo é que o Chapecó conhecia o jogo mais do que eu, mereceu vencer, e algum tempo depois encantou a todos com uma das mais brilhantes carreiras infanto-juvenis (a nível internacional) que se tem notícia.
Eu, por minha vez, segui minha carreira no tênis de forma muito satisfatória e prazerosa, tanto no âmbito pessoal quanto no profissional, por muitos anos.
Poucas vezes me lembro daquele jogo...
Aquele treino mágico... ficou para sempre!
Carpe diem!