Vai dar caldo!

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Por Raphael Favilla  •  29 de Junho de 2021

“Ê ô ê ô, Calderano é o terror!”. “Laiá laiá, Calderano é melhor do que o Neymar!”.


Há cinco anos o mesatenista Hugo Marinho Borges Calderano levava o pavilhão 3 do Rio Centro à loucura, transformando as instalações provisórias na Barra da Tijuca em um verdadeiro Maracanã.


O ano era o de 2016, e o carioca debutava nos Jogos Olímpicos. Jogando em casa, para milhares de pessoas.


Ovacionado pela torcida, o garoto, então com 20 anos, não segurou as lágrimas após a derrota, nas oitavas de final, e consequente eliminação.


“Não foi choro de tristeza. Acho que também choraria se ganhasse. É muita emoção jogar essa Olimpíada em casa e com todo mundo torcendo muito. O tênis de mesa não é um esporte popular e foi um momento muito importante para mim. Pode ter sido uma derrota nesse jogo, mas foi uma vitória para o tênis de mesa brasileiro. Ver todo mundo torcendo tanto foi uma vitória com certeza. O esporte vai ficar mais popular daqui pra frente”, vaticinou Hugo depois da derrota por 4 a 2 para o japonês Jun Mizutani, à época o sexto do mundo.


Passados quase 60 meses desde aquele dia, Calderano muito amadureceu. Evoluído tecnicamente e psicologicamente, hoje é um dos principais nomes do esporte, ocupando a 7ª posição no ranking mundial.


Tricampeão latino-americano e atual bicampeão pan-americano, Hugo defendeu por sete temporadas a equipe de Ochsenhausen, na primeira divisão da Bundesliga alemã. E por lá foi muito vitorioso. Chegou a seis finais e conquistou dois títulos: a liga alemã e a Copa da Alemanha, ambos em 2019.


Mas atualmente está de casa nova. Hugo assinou novo contrato recentemente e vai atuar no Fakel Gazproma Orenburg, da Rússia, na próxima Champions League, competição que reúne os maiores clubes de tênis de mesa do continente europeu, na temporada 2021/2022.


Será um dos grandes desafios de Calderano na carreira. O clube russo, repleto de craques estrangeiros, já conquistou cinco vezes a Champions League, sendo o segundo maior vencedor do torneio, atrás apenas dos alemães do Borussia Düsseldorf.


Mas antes, Calderano está focado integralmente em Tóquio. Onde tem chances reais de brigar por uma medalha olímpica para o Brasil, em uma modalidade esportiva até então impensável por aqui: o tênis de mesa, dominado por potências como a China e o Japão.



Atleta posa com o uniforme do Time Brasil para Tóquio 2020

Menino prodígio


Para entendermos os caminhos que podem levá-lo ao sonhado pódio olímpico é preciso voltar um pouco na história de Hugo, e conhecer um pouco mais de sua trajetória e personalidade.


Ele aprendeu a ler e escrever sozinho aos 4 anos, um verdadeiro prodígio. Gostava de ser desafiado por seus pais a fazer contas de cabeça. Se concentrava por alguns segundos e dava a resposta, sempre certa! Aliás, o poder de concentração é uma de suas principais características: Calderano tem uma coleção de mais de 70 cubos mágicos de vários tipos e tamanhos. Seu recorde ao montar o 3X3 é de incríveis 6,3 segundos.


Dos 10 aos 12 anos, além do tênis de mesa, participou regularmente de competições de vôlei e atletismo, tendo se destacado nas três modalidades. Foi titular da seleção estadual de vôlei e campeão estadual pré-mirim de salto em distância.


Aos 14 anos se mudou para São Caetano do Sul para treinar com os integrantes da seleção brasileira de tênis de mesa. Sempre muito dedicado, passou a empilhar troféus e medalhas.


Em 2013, Hugo foi o mais jovem mesatenista a vencer uma etapa do Circuito mundial da ITTF e o primeiro a vencer no mesmo ano etapas do Circuito Mundial Juvenil e Adulto.


Um ano depois, fez história ao conquistar a medalha de bronze nos Jogos Olímpicos da Juventude, na China. Foi a primeira medalha do tênis de mesa brasileiro em uma competição olímpica. Também em 2014, Hugo estreou na primeira divisão da liga alemã de tênis de mesa e causou sensação ao derrotar o ídolo local Timo Boll por 3 sets a 0.


Em 2015, foi indicado pela primeira vez ao ITTF Star Awards, a mais importante premiação do Tênis de mesa, como atleta revelação do ano. No ano seguinte, como já vimos, ficou em nono lugar na Rio 2016, igualando a melhor marca de um brasileiro na competição, conquistada anteriormente por Hugo Hoyama em Atlanta 96.


Em 2018, tornou-se o primeiro brasileiro finalista de uma etapa platinum do Circuito Mundial, no Aberto do Catar, e o primeiro latino-americano a figurar entre os 10 melhores do mundo. Seus bons resultados naquele ano fizeram com que a Federação Internacional de Tênis de Mesa indicasse seu nome ao ITTF Star Awards como melhor mesatenista masculino do mundo da temporada.


Foram dezenas de medalhas conquistadas ao longo dos últimos anos em diversos Abertos pelo mundo, individualmente ou em competições defendendo as cores do clube Ochsenhausen.


Gosta de números? Então vamos lá: Até o fechamento de 2020, foram 751 vitórias em 122 diferentes torneios, nos quais conquistou 58 medalhas de ouro, 15 de prata e 34 de bronze!


Experiência acumulada que será colocada à prova no próximo grande desafio de sua carreira: chegou a hora, as Olimpíadas de Tóquio estão logo ali!


Jogos atípicos


Depois de todo o carinho recebido pelo público na Rio 2016 é a vez de Tóquio 2020. Que, todos sabemos os motivos, será disputado em 2021.


Como será participar de uma Olimpíada com limitação de público e muitos protocolos de Covid-19? Faltando menos de um mês para o início dos Jogos Olímpicos de Tóquio, os atletas vivem a expectativa para a edição mais atípica de todos os tempos do evento, cuja presença será limitada em 50% da capacidade das arenas com limite de 10 mil espectadores nos maiores estádios.


Os atletas que irão a Tóquio começarão sua jornada 14 dias antes da viagem para o Japão, nas suas casas. A duas semanas do embarque, eles precisam passar a seguir as mesmas orientações válidas para o período dos Jogos – ou seja, distanciamento social, cuidados higiênicos e uso de máscara de acordo com o que pede o guia.


Nesse período, cada atleta também precisa preencher o seu plano de atividades, informando seus dados pessoais, onde ficará hospedado, todos os seus destinos possíveis no Japão, se utilizará transporte público e as pessoas com quem terá contato próximo.


Nas 96h anteriores ao embarque, é necessário fazer pelo menos dois testes, em dias diferentes. Se algum deles der positivo ou mesmo se algum sintoma aparecer, a viagem está vetada.


Além do básico em relação aos cuidados contra a Covid-19, como distanciamento mínimo, higienização constante das mãos, uso de máscara o tempo todo e evitar a permanência em locais sem ventilação, os atletas também foram orientados a mudar a forma de torcer. Eles deverão aplaudir, em vez de cantar e gritar, mesmo estando protegidos. Difícil de se controlar, mas vale o esforço, né?


Preparação


A conquista da medalha de ouro individual nos Jogos Pan-Americanos de Lima, em 2019, classificou Hugo automaticamente para Tóquio. O sonho em disputar mais uma Olimpíada estava concretizado ali.


No final de maio deste ano, Calderano desembarcou no Rio de Janeiro. A viagem não fazia parte do planejamento, mas foi decidida por sua equipe técnica após a constatação de uma pequena lesão no ombro do atleta. Calderano sentiu dores no local e realizou exames que indicaram a necessidade de suspender as atividades na mesa por dez dias.


Diante da mudança na programação, a equipe técnica optou pela ida de Calderano para o Brasil, onde seguiu o tratamento indicado e manteve a preparação física no CT do Time Brasil. O mesa-tenista aproveitou a presença no Rio para se vacinar contra a Covid-19.


Por causa da pandemia, Hugo Calderano não vinha ao país há cerca de um ano e meio, permanecendo na Europa inclusive nas férias.


Isolado por conta de protocolos de segurança, Calderano teve apenas a companhia da irmã, Sofia, estudante de Educação Física e Fisioterapia e da equipe médica do Comitê Olímpico do Brasil. Ainda naquele mês, Calderano foi perguntado pela assessoria de imprensa da Confederação Brasileira da modalidade (CBTM) sobre o período no Brasil.


“Foi muito bom voltar para o Rio. Não voltava desde dezembro de 2019. O Sol, o clima, a comida e o ambiente me fazem sentir muito bem. O processo de recuperação está caminhando bem. Estou aqui há pouco mais de uma semana, estou me sentindo bem, sem nenhuma dor. Daqui a pouco já quero treinar na mesa”, disse à época.


Hoje, Calderano já está de volta às mesas. E completamente focado nos Jogos. Por esse motivo, não conseguimos conversar diretamente com o atleta, que se prepara na Europa.


Desde o último dia 12, Hugo se juntou à seleção masculina de tênis de mesa, que segue se preparando em Ochsenhausen, na Alemanha, para a disputa dos Jogos. O grupo de atletas está completo e a comissão técnica conseguiu imprimir uma alta intensidade nos treinamentos.


Calderano e Vitor Ishiy em Ochsenhausen, Alemanha


Quem vem comandando os trabalhos na Alemanha é o consultor técnico da CBTM, Jean-René Mounié. Em razão de limitações por causa da pandemia de Covid-19, Francisco Arado, o Paco, técnico da equipe masculina em Tóquio, permanece no Brasil e se junta ao grupo no Japão, em julho.


Segundo Mounié, foi preciso realizar adaptações no planejamento estabelecido: “Tivemos quatro ciclos diferentes, mas no final precisamos adaptar nossas datas. No dia 18 encerraria o terceiro ciclo, mas os atletas permaneceram em atividade e treinaram forte. Todos treinaram muito bem”, contou a Nelson Ayres, assessor de Imprensa da CBTM.


“O Hugo voltou do Brasil com energia e está treinando muito bem. Ele já tem um nível bem alto e vai continuar este trabalho com muita intensidade até a viagem para o Japão”, garantiu o técnico.


Após finalizar os treinos em Ochsenhausen, o grupo viaja no dia 12 para Hamamatsu, no Japão, onde fará todo o trabalho de aclimatação e adaptação ao fuso horário. O grupo segue para Tóquio pouco antes do início das competições de tênis de mesa, marcada para o dia 24.

Créditos fotos:

Capa — Nico Schaal/Liebherr Ochsenhausen

Foto 1 Alexandre Loureiro/COB

Foto 2  Time Calderano


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