Vera Cleto e o Tênis

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Por Raphael Favilla  •  11 de Abril de 2024

Vera Cleto é uma figura emblemática no mundo do tênis brasileiro. Campeã brasileira na categoria adulta quando ainda tinha apenas 16 anos, Vera se apaixonou pela modalidade ainda criança.

"Sou de uma família de tenistas. Meu pai, Edson Cleto, foi um grande incentivador. Ele tinha até o apelido de Fominha, porque vivia em quadra. Adorava jogar tênis e ensinar, e assim fez comigo, ainda pequenininha", lembra. "Comecei por volta dos dez anos. Quem começou primeiro foi meu irmão Paulo [Cleto]. Depois eu e todas as minhas irmãs. Sempre jogando no clube Pinheiros. Acho que a velocidade da minha carreira, nessa idade foi devido ao fato de, como meu pai gostava muito de jogar, a gente treinava qualquer hora do dia", continuou.

"A gente treinava às 6 da manhã, ou às 9 horas da noite. Toda hora que tínhamos tempo livre jogávamos. Foi assim que minha carreira deslanchou rapidamente. Ganhei todos os campeonatos brasileiros de idade. Com 11 anos, com 12, com 13. Ganhando, ganhando, ganhando. Simples e duplas. Foi aí que aos 16 anos fui campeã brasileira de adulto. Fato inédito na época para uma juvenil", contou com orgulho seus feitos precoces no esporte.

Aos 17 anos, Vera foi para a Europa. Jogou Roland Garros e depois alguns torneios na grama. Cleto se saiu tão bem na nova superfície que pouco tempo depois viria a fazer semifinal em Wimbledon.


"Semi em Wimbledon foi uma conquista muito importante para mim. Naquele ano eu estava entre as quatro melhores juvenis do mundo, mas não tinha ranking à época. Fui convidada para participar de um circuito nos Estados Unidos, mas que acabou não dando certo. E convidada para jogar o Panamericano, mas também não deu certo. Tudo por conta de falta de verba. Naquele tempo não era fácil não", conta Cleto sobre o período em que o tênis não era um esporte popular.

"Mas mesmo assim tive muito suporte. De pessoas da família e também de amigos, como o Thomaz Koch, e o [Edson] Mandarino. Eles estavam na mesma época que eu na Europa, e foram pessoas super importantes para mim, me dando sempre suporte".

Vera casou cedo, aos 19 anos. E continuou a carreira até os 29 anos, quando uma lesão no cotovelo, que já a incomodava há um tempo, a tirou do circuito. Sobre este período, Vera lembra de uma situação inusitada.

"Mesmo casada continuei jogando, e fui vice-campeã brasileira, grávida do meu primeiro filho, em 1969. E depois também grávida, da Daniela, que é a minha terceira filha, em 1974, no Ceará. Perdi da Suzana Petersen na primeira vez, e depois da Patrícia Medrado, grávida. Foi bem interessante isso", contou Cleto, que entre vários títulos destacam-se o Brasileiro em quadra coberta e a Copa Santista. "Nessa época eu tinha um desafio duplo, né, de você jogar tênis e cuidar dos filhos".


"Depois eu abri uma academia de tênis em Campinas, onde eu tive a academia por 13 anos. Aí o desafio ficou triplo, né? Como técnica, a primeira oficial jogadora que eu tive foi a Claudinha Faillace, que na época era campeã juvenil. Então fui contratada, viajava com ela. Depois treinei também a Luciana Tella, a Claudinha Chabalgoity. Fui técnica da equipe juvenil no Sul-Americano e também na Federation Cup, durante vários anos", lembrou Vera, do período que representou as cores da bandeira do Brasil. "Sempre adorei representar o meu país, vestir e defender as cores nacionais", pontuou.

"Tenho até uma história. Quando cheguei na final do Orange Ball, ganhei a semifinal de uma inglesa. O diretor do torneio naquela época Eddie Herr veio até mim e falou assim 'you are a naughty girl' (garota danada), ou seja, disse que acabei com o torneio dele. Eles não queriam uma brasileira na final, queriam uma inglesa contra uma americana. Aí eu fiquei mais orgulhosa ainda, sabe, de mostrar que a gente tem o nosso valor e que a gente pode representar muito bem no esporte", concluiu.

Hoje

Atualmente, Vera se dedica a uma franquia da experimento intercâmbio cultural, desde que vendeu a academia de tênis depois de 13 anos de muitas aulas e histórias.

"Resolvi mudar as coisas. Faz seis anos que tenho essa minha franquia. Mas tenho jogado tênis bastante. Ano passado joguei o mundial em Portugal, adorei. Também tenho feito algumas clínicas", conta Cleto sobre sua atual rotina.

"Hoje sou uma das coaches do projeto Protea, que é um projeto de câncer. É uma instituição fundada por uma tenista, né? A Gabriela Antici, que promove tratamentos para pessoas que não têm dinheiro para pagar. Na pandemia também voltei a dar aula de tênis e beach tennis, e ainda dou um pouquinho. Procuro sempre me manter ativa", continuou.

"Acho que essa parte de conhecer o mundo, de vivenciar outras culturas, que seja através do tênis ou de um outro esporte, ou até mesmo de um intercâmbio, acho maravilhoso. Sempre fui super fã, e continuo sendo", finalizou.

Homenagem no Pinheiros


Desde novembro de 2022 Vera Cleto dá nome a quadra 5 do Esporte Clube Pinheiros. Foi nas quadras de saibro do tradicional clube paulistano que a família Cleto passou boa parte vida. Inclusive, a matriarca Ruth, mãe de Vera, Paulo, Teresa, Ana e da filha Ruth, bateu bola nesta mesma quadra até os 90 anos.

"É indescritível a emoção que eu senti. Quando eu soube dessa homenagem, fiz um discurso. Trabalhei nele um bom tempo e fiquei muito feliz com o resultado. A quadra 5 me traz muitas recordações, e olha... fico emocionada só de lembrar agora, entende?

"Quantos momentos inesquecíveis vivi aqui nesta quadra. Momentos de muito suor e dedicação a um esporte pelo qual me apaixonei ainda criança… Momentos de alegria e diversão com amigos que nunca esqueci…. Momentos de conquistas que me ajudaram a crescer como atleta e pessoa", dizia um trecho do discurso.

Nova Geração e momento do tênis brasileiro

Vera se mostrou muito animada com a boa fase do tênis feminino. E aproveitou para dar um conselho às jovens tenistas que começam a trilhar suas carreiras no esporte.

"Espero que elas estejam fazendo o que gostam. Isso é uma coisa super importante, essas meninas novas, Vitória [Barros] e Naná [Silva], por exemplo. É importante que estejam fazendo o que gostam. Porque eu, por exemplo, sempre adorei jogar tênis. Meu pai brincava comigo, e eu tinha realmente muita vontade de estar em quadra, de jogar, de ganhar. Quando eu perdia ficava muito brava. Mas é uma vida de muito sacrifício, de muita abdicação. Eu posso dizer que fui uma pessoa que não teve infância. Não ia nas festinhas, não sabia daquelas coisas de criança. Foi como se eu tivesse passado esse tempo todo dentro da quadra. E eu tive, claro, compensações. Mas é super importante gostar, tem que gostar, tem que curtir muito", iniciou.

"A dica que eu posso dar é que não deixem a escola, continuem a estudar. Leiam muito, sabe? Se interessem pelas coisas, não fiquem só dentro da quadra de tênis. Assistam filmes, leiam muito e se interessem por tudo que está acontecendo. E outra dica é fazer sempre o melhor que puder no momento, que seja dentro da quadra ou fora da quadra, curtam, deem o melhor de si em cada momento".

"Sobre o momento do tênis feminino, eu fico muito feliz. Aliás, não é só o feminino, não, é tanto no masculino como o feminino. Eles estão em alta e eu acho isso super legal, eu fico curtindo tudo, né? Eu sei que o sucesso, isso é uma coisa que eu sempre acreditei e eu tenho muita certeza disso, o sucesso nunca é sozinho, sempre a gente tem alguém por trás da gente nos incentivando, nos dando força. E eu acho que além de você ter as pessoas por trás de você, você ter uma organização ou uma instituição, aí é o melhor dos mundos, né? Então eu acho que aqui no Brasil a CBT sem dúvida está à frente de um excelente trabalho, ela está apoiando, eu vejo não só apenas os jogadores mas também seus técnicos, então acho que a médio a longo prazo ainda teremos muitas surpresas, muitas coisas boas", finalizou.


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