A última dança de Bellucci

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Por Raphael Favilla  •  21 de Fevereiro de 2023

"Tive o privilégio de dividir a quadra com uns dos meus ídolos. Posso dizer que tenha sido uns dos momentos mais marcantes pra mim. Me lembro de umas das primeiras vezes que cruzei com ele no US Open de 2009, eu havia acabado de ganhar o ATP 250 de Gstaad, no país dele. Nos cruzamos no vestiário, ele com uma toalha na cintura indo tomar banho e eu entrando no vestiário. Ele me cumprimentou e me deu os parabéns pelo título, fiquei sem saber o que dizer, eu não imaginava que ele sabia quem eu era. Fiquei surpreso com a humildade, mesmo com tantos títulos sempre foi muito humilde e querido por todos. Um grande ídolo não é só extraordinário dentro de quadra, mas também fora".

Estas foram as palavras de Thomaz Bellucci em homenagem à Roger Federer, quando o suíço anunciou sua aposentadoria no ano passado. Esta semana, quem se despede das quadras é Thomaz, que fará sua "última dança" na quadra principal do Jockey Club Brasileiro. O paulista dará fim a uma das jornadas mais vitoriosas de um brasileiro no tênis.

Encerrar a carreira não foi uma decisão de última hora. Nos últimos anos, as lesões afastaram Bellucci de sua melhor forma. Ele, que chegou a beirar o top 20 do ranking da ATP, hoje aparece em 917º na lista. Foram poucos os torneios disputados desde 2019. Em 2021, começou a ensaiar o adeus.

Bellucci perdeu a conta do número de lesões em mais de duas décadas de carreira. Foram tantas que cobraram um preço. "Meu corpo começou a dizer para descansar e pegar mais leve, mas ainda assim tentei me recuperar, porém não conseguia manter o mesmo desempenho. É o momento de ir para uma nova etapa e o tênis vai continuar sendo parte da minha vida. Sentirei saudades, mas é a decisão correta", contou.

Diretor do ATP 500 carioca, Luiz Carvalho contou com orgulho sobre o convite ao ex-número 1 do Brasil para encerrar a carreira no torneio. "O Bellucci é um dos maiores nomes da história do tênis brasileiro. Ele faz parte da história do Rio Open e ele merecia uma despedida em um grande palco".

Esta será a sétima e última participação de Bellucci no Rio Open. Foi no ATP 500 disputado na Cidade Maravilhosa que o brasileiro marcou uma de suas grandes vitórias da carreira, superando o japonês Kei Nishikori, na época número 5 do mundo, na edição de 2017. Ele também foi vice-campeão de duplas do torneio, em 2019, ao lado de Rogério Dutra Silva.

"É gostoso voltar aqui no Rio Open, de jogar um baita torneio que é aqui. Mas é também um gostinho amargo de saber que é o último, né? Vão ser as últimas sensações que eu vou ter como jogador e jogando em casa, com a torcida. Estou tentando aproveitar todos os momentos, todas as sensações que eu estou tendo. Não está sendo fácil a preparação. Porque nos últimos anos eu machuquei bastante, ficar treinando duro também é fisicamente difícil hoje em dia", disse o tenista de 35 anos, completados em dezembro.

"Hoje em dia aparecem pessoas falando: “Pô, comecei a jogar tênis por sua causa”. Ou: “Meu filho chama Thomaz por sua causa”. “Ah, conheci meu marido vendo um jogo seu”. É muito legal receber esse carinho das pessoas e de saber que eu fiz parte de alguma maneira da vida delas, né? Então hoje em dia eu sei que que eu represento bastante coisa assim para o tênis brasileiro.

Uma carreira repleta de grandes momentos

Bellucci começou a jogar no circuito em 2005, ainda juvenil, e seu crescimento foi contínuo até seu primeiro grande momento, em 2010, quando atingiu o 21º lugar do ranking no dia 26 de julho, o que ainda é a segunda mais alta classificação de um brasileiro na ATP atrás somente de Gustavo Kuerten. Pouco antes, em 2009, conquistou seu primeiro título de peso, em Gstaad, seguido por Santiago, em 2010.

Viveu outro grande momento em 2011, quando fez semifinal em Madri, após eliminar Andy Murray e ficar perto da vitória em cima de Novak Djokovic. Naquele sábado, a outra semi tinha Rafael Nadal e Roger Federer. Sua maior campanha em Grand Slam foram as oitavas de Roland Garros em 2010.

Bellucci ganhou ainda mais uma vez o ATP de Gstaad (2012) e Genebra (2015). Após chegar nas quartas de final dos Jogos Olímpicos do Rio, ele iniciou uma fase descendente, que começou com a suspensão por doping no final de 2017. Retornou após cinco meses, mas obteve poucos resultados expressivos desde então.

"Desde pequeno, sonhava em jogar em grandes estádios", confidenciou Bellucci. "Conquistei mais do que imaginava... e percebi que não são vitórias e títulos o mais importante, mas sensações que me proporcionaram".

As grandes façanhas, segundo o próprio Thomaz

Em entrevista ao GloboEsporte, Bellucci destacou seus momentos preferidos em quadra: o jogo contra Nadal na Rio 2016 onde, com apoio do torcida, aplicou 6/2 sobre Nadal no primeiro set, de forma avassaladora, em apenas 33 minutos.

Lembrou também da grande campanha nos Masters 1000 de Madrid, em 2011. Treinado por Larri Passos, Thomaz bateu o atleta da casa e especialista em saibro Pablo Andujar, e depois derrotou o alemão Florian Mayer. Foi aí que o grande desafio então chegou: Andy Murray, n°4 do mundo à época, pelas oitavas de final. Em sets diretos, o melhor simplista do país desde Guga superou o britânico e avançou às quartas de final.

No duelo contra Tomas Berdych, 7° do ranking, 2 a 0 de novo e rumo à semi após oito anos sem um atleta do Brasil entre os quatro melhores de um Masters 1000. Foi então que chegou a hora de Bellucci disputar uma vaga na decisão contra Djokovic. O sérvio estava invicto há 30 jogos. A partida, entretanto, se desenhou para a vitória verde e amarela por um bom tempo. O paulista venceu o primeiro set por 6/4, liderou o segundo por 3/1, mas Nole reagiu, virou e avançou à final em Madrid, onde sagrou-se campeão sobre Nadal.

Cinco anos depois, mais um encontro para ficar marcado na história. Novak Djokovic não perdia um set por 6/0 desde 2012, quando foi derrotado por Federer, mas Bellucci quebrou o tabu no dia 12 de maio de 2016, no Aberto de Roma. Em partida válida pelas oitavas de final do Masters, o brasileiro abriu o placar com o pneu, mas logo viu Djoko deixar tudo igual com uma quebra de vantagem. Na terceira e decisiva parcial, o atual número um do mundo fez 6/2 e se classificou para as quartas.

A conquista do terceiro troféu de ATP na carreira, em 2012, não podia ficar de fora dos momentos preferidos de Bellucci. Na revanche contra Janko Tipsarevic, sérvio que o eliminou na semifinal de Stuttgart uma semana antes, Thomaz encerrou um jejum de mais de dois anos sem vencer um torneio ATP 250.

O paulista perdeu o primeiro set da final em um tie-break muito disputado, que acabou no 8-6. Porém, nas parciais seguintes, o campeão do torneio de 2009 fez 6/4 e 6/2, se vingou do rival e ergueu o segundo troféu do Aberto de Gstaad, na Suíça.

"Eu tenho zero arrependimentos. Eu acho que eu me doei 100%. Eu me arrependo zero das coisas que que eu fiz na minha carreira assim. Acabo minha carreira assim, feliz por tudo que eu conquistei. Eu acho que quando você está no meio do furacão, ali nas competições e na loucura do dia a dia, você às vezes não tem noção do que está acontecendo ao seu redor. Mas, hoje em dia, acho que cai minha ficha", finalizou.

Última partida?

Bellucci vai fechar a programação da Quadra Guga Kuerten nesta terça-feira (21). Seu adversário será o argentino Sebastian Baez, 35º do ranking e campeão em Córdoba há oito dias.

O adeus às quadras será hoje? Ou o paulista vai aprontar mais uma vez?




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